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“E, assim, a fé vem pela pregação, e a pregação, pela palavra de Cristo”
Rm 10.17
O ministério da palavra definitivamente não deve ser negligenciado no meio do povo de Deus. Em razão disso, apela-se para o devido apreço às Sagradas Escrituras, ao Sola Scriptura. O fato é que todo pregador fiel prega a Palavra do Senhor com responsabilidade, sabendo que, com esse ato, os efeitos na vida do ouvinte não são provenientes dos seus talentos ou de suas habilidades pessoais, mas do Espírito Santo de Deus, que abre o coração dos ouvintes para compreender a pregação. A Confissão de Fé de Westminster apresenta que
“A graça da fé, pela qual os eleitos são habilitados a crer para a salvação das suas almas, é a obra que o Espírito de Cristo faz nos corações deles, e é ordinariamente operada pelo ministério da palavra...”.[2]
É nesse sentido que o título desse texto traz o trocadilho: “Abrir” as Escrituras para “abrir” o coração.
É certo que o simples ato de abrir a Bíblia não significa pregá-la, muito menos convencer alguém. O foco está no verbo grego dianoigo (διανοιγω), que é utilizado no Novo Testamento tanto com o significado de expor (Lc 24.32; At 17.2-3), quanto de abrir (Lc 24.45; At 16.14).
Veja o que se lê em Lucas 24.32:
“(...) disseram um ao outro: Porventura, não nos ardia o coração, quando ele, pelo caminho, nos falava, quando nos expunha as Escrituras? ”.
Os dois discípulos no caminho de Emaús revelam que seus corações ardiam quando Jesus lhes expunha (διήνοιγεν, que vem do verbo διανοιγω) as Escrituras. De igual modo, o mesmo verbo (dianoigo) aparece no marcante episódio da conversão de Lídia, descrito em Atos 16. Lá está escrito que Paulo e seus companheiros, em Filipos, foram para junto do rio, onde algumas mulheres estavam reunidas. O lugar parecia, aos olhos de Paulo e de seus companheiros, um lugar de oração. Eles aproveitaram a oportunidade e, assentados, se dispuseram a falar acerca do evangelho para aquelas mulheres. É aqui que se encontra a segunda parte do trocadilho, pois quando Lídia, temente a Deus, escutava, o Senhor lhe abriu (διήνοιξεν, que também vem do verbo διανοιγω) o coração para atender às coisas que Paulo dizia (At 16.14). O que vem a seguir é a comprovação da sua conversão, seguida pelo seu batismo e de toda a sua casa (At 16.15).
Com base no que foi dito até aqui, é possível compreender a importância do ministério da palavra e da ação do Espírito. Expor as Escrituras fielmente é o caminho para que o Espírito Santo abra o coração dos ouvintes. Consoante a isso, Hermisten Maia escreve que
“A Palavra de Deus jamais poderá ser recebida sem o ensino do Espírito. É ele quem de fato abre as Escrituras diante dos olhos humanos, capacita-os a enxergar o evangelho da glória de Deus”.[3]
Calvino também escreveu sobre a relação entre o Espírito e a Palavra:
Deus não deu a conhecer aos homens a Palavra com vistas à apresentação momentânea para que logo em seguida a abolisse com a vinda de seu Espírito; pelo contrário, enviou o mesmo Espírito, pelo poder de quem havia ministrado a Palavra, para que realizasse sua obra mediante a confirmação eficaz dessa mesma Palavra.[4]
Numa sociedade em que os valores e princípios cristãos são cada vez mais atacados, é imperativo que a igreja do Senhor abra ou exponha constantemente as Escrituras, pois “Toda Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça” (2Tm 3.16), e a palavra de Jesus foi que o Espírito Santo Consolador viria para convencer o mundo do pecado, da justiça e do juízo (Jo 16.8).
Abrir as Escrituras para abrir o coração é compreender que há uma responsabilidade para a igreja eleita, que é a pregação da Palavra do Senhor. Entender isso ajuda a evitar os mesmos erros que infelizmente muitas igrejas estão cometendo: o de priorizar outros elementos no culto, no lugar da exposição da Palavra.[5]
Conquanto seja grande o desafio de pregar para uma sociedade cada vez mais distante das Escrituras, mesmo que pareça que os ouvidos dos homens estão fechados para a exposição fiel da Palavra do Senhor, é importante não desanimar nessa missão. O caminho é abrir (expor) as Escrituras fielmente, certos de que o Espírito do Senhor há de abrir não somente os ouvidos, mas também o coração dos que ouvem a pregação. É vital cumprir com afinco o labor, afinal: “Como (...) invocarão aquele em quem não creram? E como crerão naquele de quem nada ouviram? E como ouvirão, se não há quem pregue? (...) a fé vem pela pregação, e a pregação, pela palavra de Cristo” (Rm 10.14,17).
[1] A relação entre os verbos nesse trocadilho e a inspiração para esse texto são provenientes de uma aula do Rev. Hermisten Maia no Seminário JMC.
[2] Confissão de Fé de Westminster, XIV, I.
[3] COSTA, Hermisten Maia Pereira da. A reforma e a escritura: Calvino como leitor, intérprete e pregador da palavra. Goiânia: Editora Cruz, 2017. p.41.
[4] CALVINO, João. As Institutas I.9.3. São Paulo: Cultura Cristã, 2006. p.95.
[5] Sobre a importância da pregação como instrumento do Espírito Santo para operação da fé, recomendo a leitura do capítulo 14 do Guia de Estudos da Confissão de Fé de Westminster de Chad Van Dixhorn, publicado pela Editora Cultura Cristã. Lá é possível ler como alguns teólogos participantes da Assembleia reagiram sobre o tema.
Sugestões de Literaturas:
Sola Scriptura: A Doutrina Reformada das Escrituras, Paulo Anglda (Eu quero!)
A Reforma E A Escritura - Calvino Como Leitor, Interprete E Pregador Da Palavra, Hermisten Maia (Eu quero!)
Institutas da Religião Cristã: envolvendo a soma de toda a piedade e tudo o mais que se deve saber sobre a doutrina da salvação: um livro digno de ser lido por todos que zelam pela piedade, João Calvino (Eu quero!)
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